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O que Lerner pode ensinar a Ratinho Júnior

* Artigo de opinião escrito por Clóvis Borges (diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental – SPVS)

No dia 14 de novembro de 1997 o então governador do Estado do Paraná Jaime Lerner determinou a suspensão do projeto de implantação de uma termoelétrica a carvão no município de Paranaguá, no litoral paranaense. “Determinei à Copel que estude outras formas alternativas de geração de energia, como a eólica, para prevenir o déficit energético que se projeta para os próximos anos. “Também sou ambientalista. O projeto estava causando uma polêmica muito grande e o Paraná não é o lugar adequado para a implantação de um empreendimento como esse”, disse Lerner.

“A suspensão do projeto é resultado de uma briga longa e cansativa. O governador fez o papel que devia fazer: cuidar dos interesses públicos e coletivos”, comentou à época à jornalista e ambientalista Teresa Urban.

A decisão do governador Lerner ocorreu antes mesmo de ser finalizado o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do Empreendimento. Rodolfo Ângulo, um dos profissionais responsáveis pelo diagnóstico que estava em fase final, comentou: “O RIMA faz apenas uma avaliação técnica, mas existiam implicações políticas e estratégicas para a aprovação do empreendimento, e o governador deve ter considerado esses aspectos”.

O caso emblemático da termoelétrica de Paranaguá não só salvou o litoral do Paraná de um investimento indevido e que só interessava a três empresas envolvidas (Copel, Inepar e a chilena Chilenger). Lerner foi o grande vencedor desse evento, uma vez que teve a percepção que apenas os mais experientes gestores públicos dispõem: se aprovasse a termoelétrica de forma impositiva e contrária à opinião da maioria da população, faria um favor político a um grupo minoritário e comprometeria sua imagem a longo prazo.

Só um verdadeiro estadista tem a coragem e a capacidade de uma tomada de decisão que, mesmo contrariando interesses econômicos imediatos, atrelados a acordos políticos de qualquer espécie, faz prevalecer, em última instância, o que seja coerente com a sua consciência e com o interesse público. Lerner não é reconhecido apenas pelo que executou, portanto. Mas também pelo que evitou que ocorresse durante sua permanência no posto de maior poder dentro do Estado do Paraná.

Ratinho Jr. anunciou, praticamente no primeiro dia de sua primeira gestão como governador, iniciada em 2019, que uma prioridade máxima de seu governo seria a implantação do “Porto de Pontal do Paraná”, empreendimento condicionado a uma estrada chamada de “Faixa de Infraestrutura” e à implantação sequencial e contingenciada de um amplo conjunto de grandes empreendimentos ligados ao ramo do petróleo. Em sua percepção, essa seria a melhor maneira de garantir o desenvolvimento de um município balneário, estagnado economicamente.

Embora a vontade política seja aspecto relevante numa definição final sobre a viabilidade dessas pretensões existentes, processos judiciais sobre diversas irregularidades e um clamor crescente da opinião pública têm colocado obstáculos na tendência de aceleração imposta pela nova gestão estadual, não havendo razão evidenciada sobre a motivação de tal açodamento. Mais importante do que isso, o governo do Estado do Paraná não comprova existir necessidade de uma nova região portuária além da que já está em operação e expansão no município de Paranaguá.

Obviamente o cidadão paranaense já tem larga experiência sobre as manobras que impõem, em nosso País, empreendimentos que não se justificam. Estamos em fase de limpar a casa de procedimentos que amparam o interesse econômico em detrimento dos interesses da sociedade. Existem anteparos gigantescos buscando impedir que o município de Pontal do Paraná seja obrigado a abandonar sua aptidão natural de turismo e de turismo de natureza.

Por meio do Ministério Público e por processos estabelecidos por terceiros, as dúvidas levantadas sobre o empreendimento pretendido vão desde a dominialidade das terras até inconsistências nos processos de licenciamento, passando pela capacidade conhecida de influência política do principal empresário interessado, o Sr. João Carlos Ribeiro.

O que se pontua até o momento é que a motivação sobre Pontal não corresponde, absolutamente, a uma visão estratégica de desenvolvimento. Por sinal, repetindo o caso da termoelétrica de Paranaguá, na década de 90. Trata-se de mais um embate entre as musculosas influências políticas para impor empreendimentos fora de contexto e de uma enorme parcela da sociedade paranaense disposta a posicionar-se frente à defesa da Ilha do Mel e o incremento do turismo de natureza. Esta, uma visão mais coerente e racional que garante ao Paraná a exploração de seu potencial econômico de uma forma diversificada, onde Paranaguá tem amplas condições de responder pelas importantes demandas portuárias e industriais.

Se o exemplo e a sabedoria de gestores públicos que estiveram pressionados a enfrentar dilemas dessa natureza servirem de referência ao jovem governador do Paraná, seu futuro político poderá ser ainda mais profícuo e vitorioso do que as expectativas atuais preconizam. Mas para isso é preciso haver humildade e coragem para as tomadas de decisão esperadas pela sociedade paranaense.

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